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Terceiro Tempo

"Em futebol, o pior cego é o que só vê a bola." - Nelson Rodrigues

Terceiro Tempo

"Em futebol, o pior cego é o que só vê a bola." - Nelson Rodrigues

Royston Drenthe, quando a mentalidade e atitude deixam-te sem oportunidades

30.01.19, Terceiro Tempo

Royston Drenthe foi uma das maiores promessas do futebol mundial mas actualmente joga na segunda divisão do seu país natal, no Sparta Rotterdam. Longe dos grandes palcos e dos holofotes da mídia, o que deu errado na carreira de Drenthe para não ter conseguido manter o nível exibicional?

Royston Drenthe a tentar recuperar o seu futebol ao serviço do Sparta Rotterdam

 

A célere música de António Variações -  "Quando a cabeça não tem juízo, o corpo é que paga" - assenta que nem uma luva na carreira de Royston Drenthe. Um jogador que esteve no estrelato mas devido a acontecimentos extra-futebol, viu a sua carreira entrar numa decadência extrema até chegar ao ponto de abandonar o futebol por uns tempos para se dedicar à música. 

Royston Ricky Drenthe nasceu a 8 de abril de 1987 na cidade de Roterdão, na Holanda, mas com origens do Suriname. Desde muito cedo se percebeu que tinha habilidade com a bola nos pés, não fosse ele primo de um dos melhores jogadores holandeses da atualidade, Georginio Wijnaldum.

Começou a dar os primeiros pontapés na bola num clube do bairro chamado Neptunus onde acabaria por evoluir e dar nas vistas aos principais clubes da cidade e em 2000 acabaria por ingressar nas camadas jovens do Feyenoord (ainda teve um curto período - dos 15 aos 16 anos - no Excelsior, mas rapidamente voltou ao Feyenoord). Na primeira temporada que teve hipóteses na equipa principal acabou por não largar mais o onze inicial. Um jovem de 18 anos, muito rápido e com uma capacidade de drible bem acima da média para o campeonato holandês, fizeram com que fosse dono e senhor do lugar da faixa esquerda do Feyenoord durante a temporade de 2006/2007. O culminar da excelente época acontece na chamada para o Campeonato da Europa de Sub-17 (em que a Holanda é a vencedora) com Drenthe a ser um dos jogadores fundamentais na caminhada da Holanda rumo ao título, este bom desempenho e com "meia Europa" a querer assegurar a jovem estrela, foi o Real Madrid que se chegou à frente e pagou 14 milhões de euros pelo prodígio.

 

 

Na primeira época vestido de blanco, Royston Drenthe, apenas com 19 anos, assumiu algum protagonismo e nessa temporada ganhou a Liga Espanhola. Era difícil pedir melhor para um ano de estreia no clube onde, talvez, a pressão existente seja maior do que em qualquer outro clube. Drenthe termina a sua primeira época com 26 jogos efetuados, 10 como titular e com 3 golos marcados, algo bem razoável tendo em conta que Drenthe sempre actuou mais como defesa-esquerdo.

Se a primeira temporada de Drenthe no clube tenha deixado alguns adeptos com a água na boca porém não se viu muito mais magia do pé esquerdo do Holandês nas temporadas seguintes. Representou o Real Madrid por mais duas temporadas, somando essas temporadas acabaria por jogar 28 vezes e marcando por uma vez porém apenas jogou 1456 minutos (equivale a mais ou menos 17 jogos completos). Poucos minutos para um jogador que precisava de jogar para evoluir.

Nunca mais voltaria a vestir a camisola do Real Madrid mesmo tendo mais dois anos de contrato com a equipa espanhola. O próprio admitiu que teve alguns problemas e que «a relação com Mourinho numa foi boa», distraiu-se muitas vezes na noite e saía «sem o consentimento do clube» mas que «muitos jogadores também o faziam» mas sem revelar nomes.

 

Fui com um amigo ao casino e de repente apareceram duas raparigas muito bonitas. Fomos para um hotel os quatro. A terminar, veio o problema. Pediram-nos mil euros a cada um. Nem tinha ideia que era preciso pagar. Pensava que era apenas diversão. Não levava dinheiro, só cartões. E não ia pagar, tinha vergonha. Acabámos por dar todas as fichas que ganhámos no casino.

 

Sem espaço na equipa de José Mourinho, Royston Drenthe é emprestado ao Hércules, também de Espanha, e que naquela temporada estava a representar a primeira divisão do futebol espanhol. Um empréstimo que servia, acima de tudo, para voltar a valorizar um jogador que tinha perdido o foco nas últimas duas temporadas. Apesar de uma época, a nível individual, em que foi titular mas que foi tendo alguns problemas físicos que não o permitiram jogar mais, Drenthe sempre que estava disponível era sempre o titular da ala esquerda, porém não foi capaz de ajudar a equipa a evitar a despromoção naquele ano.

De volta a Madrid após o término do empréstimo e com várias propostas em mão, nomeadamente de Porto e Benfica, em que Drenthe foi prentório a dizer que «para esses dois clubes eu não vou», o holandês optou por jogar na Liga Inglesa ao serviço do Everton.

 

 

Na Premier League, Drenthe assumiu algum protagonismo, pelo menos superior às épocas do Real Madrid e ao empréstimo que teve ao Hércules. Jogou por 27 vezes (metade delas como titular) e marcou por 4 vezes. Mais uma vez, as atitudes fora do relvado prejudicaram a sua estabilidade no clube, Drenthe afirmou mesmo que «teve vários desencontros com David Moyes» e que «se fosse hoje não teria tomado algumas atitudes que tomou contra o treinador».

É devido a esta maturidade que teimou em não chegar que Drenthe perdeu o espaço no Everton e viu o clube a não exercer a sua compra. Acabou, em 2012, por regressar a Madrid mas com guia imediato de marcha porque terminava o contrato com o clube madrileno. 

Sem clube, Drenthe era um alvo apetecível para clubes de menor expressão da Turquia, Grécia e Rússia. Porém, o jogador tentou forçar o seu regresso ao Feyenoord de forma a relançar a sua carreira que estava estagnada desde a sua primeira época no Real Madrid. O Feyenoord foi perentório em dizer não há vinda de Drenthe mesmo a custo zero e o holandês fez-se a vida e assinava um contrato de 6 meses com os russos do Spartak Vladikavkaz apenas para manter o ritmo de jogo. Com apenas 6 jogos e 3 golos marcados, o Spartak ficou na última posição do campeonato e acabaria por descer de divisão (a segunda descida de divisão da carreira de Drenthe) e Drenthe abandonou o clube rumo ao Reading, de Inglaterra.

No Reading, Drenthe estaria longe dos holofotes, isto porque assinava por uma clube do Championship - equivalente à nossa segunda liga de Portugal. Uma temporada no Reading chegou para os dirigentes perceberem que Drenthe não era o que eles queriam apesar de Royston Drenthe ter participado em 24 jogos, 17 deles na condição de titular. Não foi suficiente para convencer o clube e foi emprestado na temporada seguinte também para um clube da segunda divisão, o Sheffield Wednesday mas, uma vez mais, não convenceu e... em Janeiro foi repescado e assinou em definitivo, por um contrato de apenas seis meses, pelos turcos do Kayseri, clube que estava aflito na luta pela permanência. Assumiu-se como jogador titular mas não foi suficiente para ajudar a equipa a não descer de divisão. Drenthe estava amaldiçoado e, pela terceira vez, fui ver uma equipa em que estava a jogar ser relegada para a segunda divisão.

 

 

Face a despromoção do Kayseri, na época 2015/2016, Royston Drenthe viu-se novamente sem clube e sem surpresas acabaria por rumar a um clube e país com pouca expressão futebolística, o Baniyas, dos Emirados Árabes Unidos. Com a exigência de ser a camisola 7 do clube e com um futebol com o ritmo bem mais baixo e menos técnico que Drenthe estava habituado assumiu a titular em todos os jogos pelo clube marcando... zero golos. Sim, o holandês rumou ao Baniyas e com 24 jogos realizados, nesta fase da carreira a jogar um bocado mais à frente no terreno, como extremo-esquerdo, o jogador não foi capaz de marcar qualquer golo. Uma das poucas temporadas da sua carreira que termina sem qualquer golo marcado.

Com a carreira claramente sem rumo e com escolhas duvidosas nos últimos anos feitas por Drenthe, o holandês termina a carreira aos 29 anos simplesmente porque «deixou de ter prazer em jogador futebol» e dedicou-se a tempo inteiro à sua carreira enquanto rapper, sob o nome de Roya2Faces.

De volta à "sua" Holanda, Drenthe esteve parado durante 1 ano e meio do futebol. Até que no início desta temporada assumiu que ia voltar, desta vez com 31 anos mas com uma nova alma e maturidade.

 

Agora sou eu que trato dos meus acordos. Não era assim, agora sou mais homem. Assinava tudo o que me punham à frente e fui sempre enganado. Não pode ser, quero que os meus filhos se sintam orgulhosos de mim.

 

Royston Drenthe assinou pelo Sparta de Roterdão, o clube da sua cidade, o próprio admite que «está feliz» porque neste momento joga «num clube que fica praticamente no meu jardim». No ponto de vista de Drenthe, o Sparta tem  «excelentes infraestruturas» e não tem dúvidas que «é um clube de primeira liga», «estou perto dos meus amigos e da minha família, tenho tudo para estabilizar aqui e voltar a demonstrar meu futebol».

Não sabemos como vai terminar a temporada, mas o que é certo é que a pausa que Drenthe deu ao futebol apesar de ter custado, foi vantajosa para o mesmo. Reencontrou-se e está a jogar a um nível que há muito não o conseguia fazer. Participou em 18 jogos nesta temporada ao serviço do clube da segunda divisão holandesa, e em todos os jogos foi titular marcando já por 4 vezes. O Sparta de Roterdão está, neste momento, na quarta posição da Liga, posição essa que dá acesso ao playoff de subida ao principal escalão daquele país.

 

 

Com 31 anos, uma família e com uma carreira musical já com diversos singles. Drenthe tentará agora reerguer-se e voltar a jogar na primeira divisão do seu país. Para trás, fica uma carreira com altos e baixos, baixos esses que prejudicaram em demasia a sua capacidade de progressão para atingir outros patamares. Apesar de tudo, esteve por três temporadas ao serviço do Real Madrid, considerado por muitos o melhor clube do mundo onde actuou por 64 vezes. O ponto mais alto da carreira de Drenthe foi a primeira, e a única, internacionalização ao serviço da Holanda.