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Terceiro Tempo

"Em futebol, o pior cego é o que só vê a bola." - Nelson Rodrigues

Terceiro Tempo

"Em futebol, o pior cego é o que só vê a bola." - Nelson Rodrigues

Kerlon, o "foquinha" que não passou de uma promessa

28.04.20, Terceiro Tempo

Quem não se lembra do Kerlon Foquinha? Formado no Cruzeiro, o extremo era conhecido por Foquinha por ter criado o "drible da foca" que consistia em subir a bola para a sua cabeça e indo por ali fora até às áreas adversárias. A única forma de parar o jogador, na maioria das vezes, seria com recurso à falta e, muitas delas, graves. Podem ver aqui um pequeno vídeo de alguns dribles que o jogador fazia, nomeadamente ao serviço do clube brasileiro. E saiu para a ribalta precisamente devido a este drible porque a nível de outras valências técnicas ficou sempre aquém do esperado.

Kerlon nasceu em Ipatinga, região com mais de 200 mil habitantes situada em Minas-Gerais, em 1988. Desde cedo o pequeno Kerlon mostrou habilidade com a bolas nos pés e... na cabeça. Entrou para as camadas jovens do Cruzei em 2001 com apenas 13 anos e destacou-se sempre pelos vários campeonatos de base que existiam no Brasil, muito por culpa do drible que já explicamos acima. Devido ao facto de ser um jogador franzino e muito pequeno (Kerlon tem apenas 1,65 metros) teria de se destacar de outra forma porque haviam muitos jogadores da base que eram mais fortes que ele. O drible da foquinha acentava que nem uma luva, colocar a bola por cima da cabeça e ir correndo o campo inteiro até à área adversária valeram algumas entradas mais agressivas por parte dos adversários: como era um drible novidade nos campeonatos, ninguém saberia ao certo qual a melhor forma de o travar, pelo menos no início e começou a ganhar maior notoriedade internacional a partir do Sul-Americano Sub-17 de 2005, disputado na Venezuela, em que o Brasil sagrou-se campeão e Kerlon foi o artilheiro (com oito gols) e eleito o melhor jogador da competição.

Sendo destaque nas camadas jovens do Cruzeiro, Kerlon viria a estrear-se com a camisola da Raposa em 2005 num jogo a contar para Taça do Brasil diante do Baraúnas. Ao todo foram 79 jogos, em três anos, com a camisola do Cruzeiro e 5 golos apontados. O problema é que foram surgindo cada vez mais agressões ao jogador, isto porque o seu drible era visto como uma espécie de anti fairplay e, acima de tudo, desrespeitoso para o adversário.

Existiu um episódio, diante de um dos maiores rivais do Cruzeiro, o Atlético Mineiro. Jogando fora de portas, e estando o Cruzeiro a ganhar por 4-3, os ânimos já estão exaltados, e o drible do jogador pareceu, aos atleticanos, uma atitude ofensiva. Por conseguinte, o agredido passou a ser agressor, gerando uma confusão generalizada no estádio, com direito à expulsão de um jogador do Atlético Mineiro. As lesões acabaram por prejudicar a carreira do jogador no Cruzeiro, que passou por três cirurgias: primeiro no tornozelo esquerdo, e em ambos os joelhos, que acabaram o afastando dos relvados por vários meses. Aliás, as lesões foram mesmo o grande impedimento de Kerlon não ter conseguido chegar a outros patamares do futebol.

Mesmo com os problemas nos joelhos, Kerlon cumpria o sonho de jogar no futebol europeu. O Chievo Verona, de Itália, viu com bons olhos a chegada de Kerlon Foquinha pelo qual pagaram 1,3 milhões para contar com o jogador nos seus quadros. Não conseguiu triunfar em Chievo, participou em apenas 4 jogos (com um golo marcado) e no final da temporada tinha guia de marcha do clube. O destino? Nada mais que um dos clubes mais poderosos de Itália, o Inter de Milão. Não iria ter espaço na equipa principal na época 2009/10, seria emprestado ao Ajax de forma a encontrar o seu futebol num campeonato propício a ter mais golos, com mais espaço para jogar e onde Kerlon poderia reencontrar o seu espaço. Nem sequer chegou a estrear-se pelo clube holandês. As lesões e o aumento do peso fizeram com que o brasileiro decaísse gradualmente de rendimento adiando a sua afirmação como jogador.

Desaparecido do mapa com passagens posteriores por empréstimo ao Paraná da Série B do Brasil e Nacional de Patos onde só há registo de um jogo onde atuou por apenas 15 minutos... Kerlon estava muito longe dos seus melhores tempos e viu o seu empréstimo com o Internazionale chegar ao fim. A sua carreira precisava de um novo rumo e eis que surge, em 2013, o Japão na vida do craque brasileiro.

Quatro longos anos se passaram até o “Foquinha” de outrora reaparecer, mas não da forma que os adeptos do Cruzeiro imaginavam. Foi na garrafa de um refrigerante japonês, criada em homenagem ao jogador quando este foi para o Japão, que a antiga estrela ressurgiu. Kerlon, por outro lado, ainda tentou repetir a sua famosa artimanha pelo Fujieda MYFC que representava a terceira divisão daquele país que, comparativamente a outros anos, pode-se afirmar que foi onde Kerlon conseguiu tirar proveito do seu futebol. Em meia época, Kerlon realizou oito jogos, foram três golos e seis assistências. O suficiente para tirar a equipa da linha de água e posicioná-la no meio da tabela. Na segunda temporada, afirmou-se como um dos ídolos da cidade, a garrafa era um sucesso e Kerlon continuava completamente integrado na equipa. Na segunda temporada fez o gosto ao pé por seis vezes em catorze partidas. Com algumas lesões pelo meio que o impediram de ter mais minutos de utilização, Kerlon fecharia o ciclo do Japão para apostar no... Weymouth Wales, um clube dos Barbados. Não existindo qualquer registo de jogos efetuados.

Com a passagem pelas Caraíbas sendo um fracasso, Kerlon ruma, em 2015, ao Estados Unidos da América pouco tempo depois para representar o Miami Dade FC, equipa que foi fundada apenas em 2014 para realizar apenas 5 jogos fazendo o gosto ao pé por 3 vezes. Os últimos anos de carreira de Kerlon no futebol foram marcados pelas lesões e, sobretudo, pela mudança. Era raro ver o jogador a frequentar um clube por mais de duas temporadas, aliás, desde que saiu do Japão apenas teve, no máximo, 9 meses num clube. Manifestamente pouco para um jogador que precisava de mais estabilidade na sua carreira.

Com a experiência pela equipa da Florida a chegar ao fim, eis que Kerlon assina pelos Slimena Wanderers, de Malta. Tinha iniciado a sua vida em Malta para fazer testes no Birkirkara mas acabou assinando pelo Slimena. Ali, foram oito jogos com apenas dois golos marcados e com guia de marcha para voltar a procurar um novo clube. Essa nova oportunidade chegaria do Brasil para representar o Villa-Nova onde disputou 3 jogos (todos na condição de suplente) para o campeonato mineiro. Sem conseguir encantar os adeptos e convencer os dirigentes, o contrato é rescindido e Kerlon volta novamente para a Europa, desta vez para representar o Spartak Trnava, da Eslováquia.

Kerlon assina por um ano e meio, a expectativa era relativamente alta para o jogador e para os próprios dirigentes do clube que viam em Foquinha um jogador que poderia fazer realmente a diferença nos jogos, porém as expectativas saíram furadas. Com apenas 170 minutos distribuídos por 4 jogos (mais uma vez, sempre como suplente) não convenceram e o clube rescindiu o contrato no final da temporada.

Em 2017, sem clube, Kerlon, com apenas 29 anos, dá por terminada a sua carreira enquanto futebolista.

O futebol fez-me perceber em certos momentos o lado bom e o lado mau do homem e ensinou-me o caminho certo que todos devemos andar. Passei por momentos de muitas tristezas, de muitas lesões e de muitas desconfianças. Mesmo assim lutei, tentei e mesmo passando por seis cirurgias de LCA e duas de ligamento no tornozelo sempre tenteirecuperar e continuar a fazer o que mais gosto, jogar futebol [...]  Finalmente eu perdi para as lesões, fui muito além de minhas forças, mas fico feliz por ter tido a oportunidade de viver coisas boas e agradáveis que só o futebol pode proporcionar.

Kerlon Foquinha, no momento da despedida

Goran Pandev e a Akademija Pandev, clube criado na sua Macedónia para potencializar jogadores

21.04.20, Terceiro Tempo

O futebol da Macedónica está longe de ser um futebol competitivo e com qualidade técnica. Contam-se pelos dedos de uma mão os jogadores que triunfaram em grandes clubes provenientes deste país. Existe um jogador que conseguiu tudo isso. Fez carreira praticamente em Itália, tem mais de 100 internacionalizações pelo seu país sendo considerando por todos como o melhor jogador macedónio de todos os tempos e, chegou ao topo do futebol, com a conquista da Liga dos Campeões, tudo isto é Goran Pandev. Hoje não vamos enaltecer a carreira do avançado (talvez numa próxima rubrica), hoje iremos falar como um campeão não vira as costas ao seu país e faz de tudo para potencializar o futebol e dar cada vez mais e melhores condições ao jovens de praticar futebol e conseguirem singrar no desporto rei.

A academia criada por Goran Pandev era uma ideia antiga que o jogador tinha. Conseguiu concretizá-la em 2010, na sua terra natal, sob o nome de Akademija Pandev tinha o único e principal objetivo de fornecer melhores condições para os jovens macedónidos terem mais condições e estarem preparados para a competição assim que chegassem ao futebol profissional.

Começando apenas como projecto de formação de jovens atletas, a Academia rapidamente criou também uma equipa de seniores. O projecto inicial era apenas dar mais capacidade aos jovens atletas tanto que o avançado não tem outras responsabilidades na Akademija Pandev para além do financiamento das actividades

Ele é o dono, mas não tem qualquer cargo no clube, e não está envolvido na gestão. Só dá o dinheiro. Desde o início que colocou pessoas da confiança dele a dirigir o clube para poder concentrar-se na carreira

Filip Zdraveski, numa entrevista ao jornal Publico

O clube começou por partilhar um campo na zona de Strumica, no leste da Macedónia do Norte (perto da fronteira com a Grécia e Bulgária), que é a terra que viu nascer Goran Pandev com lotação para quase 15 mil pessoas. Em 2018, devido a alguns litígios no que dizia respeito ao pagamento mensal do aluguer do campo para os jogos e treinos da equipa, o clube criado por Pandev viu-se "obrigado" a mudar de instalações. A decisão seria, obviamente, permanecer na cidade de Strumica e a escolha recaiu no que é partilhado atualmente pela Akademija Pandev e o FK Horizont Turnovo (da terceira divisão da Macedónica) com lotação máxima de 1500 pessoas.

Com este investimento feito por Pandev no país, começaram abrir academias um pouco por todo o país e o clube de Pandev conseguiu recrutar os maiores talentos para fazerem parte do clube. Já na temporada de 2014/2015, com quatro anos de existência, resolveu-se criar uma equipa sénior para os jovens com 18/19 anos pudessem ter um outro nível competitivo que não teriam se apenas jogassem diante de adversários da mesma idade. As leis ditaram que o clube deveria começar na quarta divisão e o processo foi natural, apenas jogando com jogadores sub-21 (ou mais jovens), a Akademija Pandev foi subindo degrau a degrau estando atualmente na primeira divisão da Macedónia, lugar esse que ocupam desde a temporada 2017/18 depois de se sagrarem campeões da segunda divisão.

E o clube continua a desenvolver o seu percurso na primeira divisão. Na época de estreia foi sexto classificado no principal escalão e chegou às meias-finais da Taça. E na temoprada seguinte, 2018/19, ficaram em terceiro lugar e conseguiram uma conquista inédita: a Taça da Macedónia, que valeu, imagine-se, o acesso a disputar a pré-eliminatória da Liga Europa, que viriam a perder diante do Zrinjski Mostar, da Bósnia, por um agregado de 6-0 (derrota por 3-0 em ambos os jogos). De recordar que muito dos jogadores têm apenas 21/22 anos e que a experiência que tinham de competição europeia era zero.

E, à medida que alcança os objectivos desportivos, vai cumprindo a missão para a qual foi criado: em junho de 2018 transferiu Jani Atanasov, que aos 17 anos já jogava de início na equipa principal, para o Bursaspor, da Turquia, por cerca de 600 mil euros.

Uma outra situação curiosa e que é tem levantado algumas críticas prende-se com o facto de o avançado titular ter 32 anos e ser nada mais, nada menos que Sasko Pandev, irmão de Goran Pandev. Segundo a imprensa local daquele país, afirmam que Sasko está no clube apenas por ser irmão de Pandev porque caso contrário já teria saído. Ainda foram um bocado mais longe dizendo que sempre que Sasko Pandev está em campo a equipa resente-se porque não tem qualidade para disputar a primeira divisão da Macedónia...

Outra característica deste país é que normalmente os clubes têm uma falange de apoio devido à sua história e conquistas passadas, a Akademija Pandev é um clube novo, está a cumprir este ano, dez anos de existência mas continuam com pouca história e tradição.

O pontapé de saída foi dado por Pandev com a criação do clube. Se a ideia seria apenas potencializar jogadores jovens para estarem mais capazes de chegarem aos principais campeonatos europeus, o que é certo é que atualmente a Akademija Pandev tem crescido a olhos vistos e é atualmente um dos clubes mais fortes da Macedónia.

Chencho Gyeltshen, o Ronaldo do Butão

14.04.20, Terceiro Tempo

Chencho Gyeltshen deverá ser um nome desconhecido para a maioria dos amantes do desporto rei, isto porque joga no joga num país (e seleção) com pouca expressão e consideravalmente reduzido tendo em conta outros países da Ásia. O Butão, um país localizado no sul da Ásia, conta apenas com 700 mil habitantes, felizmente o jogador Chencho Gyeltshen tem a oportunidade de ser chamado de CG7, o Ronaldo do Butão, devido ao seu estilo de jogo e por ser fã acérrimo do internacional português.

Há 23 anos atrás, a 10 de maio, nascia no distrito de Paro, Chencho Gyeltshen. Paro, apesar de ser a única cidade que possui um aeroporto naquele país, situa-se a aproximadamente 50 quilómetros de Thimbu, que é considerada a capital daquele país. Desde pequeno mostrou o gosto pelo futebol, muito por culpa e incentivo do seu irmão mais velho (que não seguiu a carreira de jogador) porque se não teria entrado para um grupo de artes marciais, como é natural naquela região da Ásia. Decidiu parar os estudos para se dedicar a 100% ao futebol e tentar uma carreira como jogador profissional. Integrou as camadas jovens do Druk Athletic, clube sediado na capital do país, que disputou pela primeira vez, em 2011, a principal divisão daquele país. Em algumas entrevistas, sempre citou que é em Cristiano Ronaldo em quem se inspira por sua dedicação tê-lo tornado o melhor jogador do mundo mais de uma vez. Talvez por isso que a sua posição em campo é a de avançado.

Em 2008, com apenas 12 anos, o jogador butânes, ingressa nas camadas jovens do Yeedzin, clube que também estava sediado na capital. Até 2014, Chencho esteve no clube, conquistando por uma vez o campeonato da primeira divisão sendo um dos jogadores mais importantes nessa conquista. Foram também finalistas vencidos na Taça, a excelente exibição de Gyeltshen, coroada com dois golos, não foi suficiente para levantar a taça. Nesse mesmo ano, volta para o Druk City para disputar a segunda divisão do país, mas sem conquistar nada de muito relevante.

Em 2015, com 19 anos, o jogador decide mudar de clube, mas manter-se na capital do Butão, ingressa no Thimphu que disputava também a segunda divisão. Nesse ano, Chencho em apenas 10 jogos marcou 20 golos, o que chamou atenção de clubes de outros países. Era o início do sonho para Chencho se tornar jogador profissional de futebol.

Foi oferecido a diversos clubes, como é o caso do Macchindra FC, do Nepal, que aceitou em ter o jogador nos seus quadros mas que deveria primeiro concluir os estudos para assinar um contrato pelo clube. Sendo assim, no início de 2015, o Buriram United, da Tailândia, aceitou que o jogador realiza-se alguns testes à experiência no clube. O Buriram disputa a primeira divisão da Tailândia e onde o futebol tem mais condições que aquelas que Chencho teria no Butão. Depois de ter participado, durante um mês, num grande número de treinos e jogos amigáveis pela equipa principal do Buriram United, o período de experiência chegaria o fim e Gyeltshen teria de voltar a casa. Devido a umas complicações com o voo, a sua passagem foi cancelada e teve de permanecer na cidade por mais uns dias e o Buriram aceitou em contar com o jogador por mais algum tempo. E é aqui o momento de viragem. Com o início do campeonato da Tailândia, Chencho teve a oportunidade de disputar dois jogos oficiais pelo clube, um deles, entrou aos 80 minutos e, passado apenas 4 minutos, fazia o gosto ao pé e marcava o seu primeiro golo como jogador profissional. Este golo deu-lhe protagonismo internacional e foi oferecido pelos dirigentes do Buriram um contrato para permanecer mais algum tempo na Tailândia. Porém, Chencho recusou a hipótese: «Poderei voltar ao clube num futuro próximo mas, neste momento, tenho de voltar ao Butão e ao meu clube que está à minha espera».

O regresso ao seu país não se deu por muito tempo, isto porque o jogador voltaria à Tailândia para jogar pelo Surin City, uma filial do Buriram United, que estava na segunda divisão. O Buriram chegou acordo com o Thimphu para a transferência do jogador que assinou um contrato válido por uma temporada e meia. Com este contrato, Chencho Gyeltshen tornou-se no primeiro jogador de sempre do Butão a ter um contrato profissional num clube fora do seu país. Não é conhecido o seu registo na totalidade na passagem por empréstimo pelo clube, alguns sites afirmam que marcou nove golos durante toda a temporada, um bom pronúncio para um jogador que tinha acabado de se tornar profissional. Sem espaço no clube no seu regresso do empréstimo, seria novamente emprestado desta vez ao Nonthaburi FC onde esteve apenas durante um mês, isto porque Chencho rescindiu o seu contrato com o Buriram para assinar pelo Satun United, também da Tailândia, um contrato que seria válido por duas temporadas.

Ao terminar a época no Satun com apenas três golos marcados e sem espaço no clube, Chencho volta ao Butão para representar novamente o Thimphu. Com a experiência que adquiriu em campeonatos mais competitivos, a sua chegada ao Thimphu foi fundamental ao tornar-se o melhor marcador do campeonato com uns impressionantes 15 golos em apenas 10 jogos realizados. Com a boa época realizada na segunda divisão, Chencho chamou atenção do Terton, clube que tinha acabado de ser campeão da principal divisão do Butão, em 2016. Aí, apenas participou em dois jogos oficiais com dois golos marcados porque pouco tempo depois, o atacante volta a mudar de ares, desta vez o destino seria o Bangladesh.

Ainda estavamos em 2016, e Chencho já tinha jogado por três clubes diferentes. Chegou ao Chittagong Abahani, clube da primeira divisão do Bangladesh, com um contrato de apenas três meses com um salário mensal de 4 mil euros, tornando-se, naquele momento, o jogador mais bem pago do país. Sem conquistar nada de muito relevante, ao acabar o contrato de três mses com o clube, o Chittagong comunicou que optou por não renovar contrato com o jogador e Chencho regressaria ao Butão. Ao serviço do clube do Bangladesh, em três meses, marcou 5 golos em 7 jogos efetuados.

Em janeiro de 2017, com apenas 20 anos e com passagens por oito clubes diferentes, assinou contrato pelo Thimphu City (não confundir com o clube apenas Thimphu que Chencho também representou) tornando-se o nono clube da sua carreira. Participou na qualificação para a Liga dos Campeões asiática mas o Thimphu foi eliminado ainda nas fases preliminares da competição, mesmo assim, foram a equipa do Butão que mais longe conseguiu chegar naquela competição. Para o campeonato de 2017, Gyeltshen marcou 22 golos em apenas 14 jogos, tornando-se, sem surpresas, o melhor marcador do campeonato (pela segunda vez), e o Thimphu tornou-se campeão sem qualquer derrota (13 vitórias e 1 empate) com 40 pontos (num máximo de 42) conquistados. A excelente época no panorama individual, valeu o salto para a Índia.

Em agosto de 2017, o Minerva Punjab, da segunda divisão indiana, chegou acordo com Chencho Gyeltshen num contrato válido por um ano. O Minerva não teria grandes expetativas para aquela época, com o desenrolar dos jogos, e Chencho a ser titularíssimo na equipa e peça fulcral (não perdeu qualquer jogo), o Minerva acabou por alcançar a promoção para o principal escalão com o Ronaldo do Butão a marcar por 7 vezes em 18 jogos. Com mais uma bela época protagonizada pelo avançado, o Bengalaru, também da Índia, resolveu contratar o jogador que, tal como aconteceu no Minerva, um contrato válido de apenas uma temporada.

Não tendo o mesmo protagonismo que teve nos últimos dois anos, a meio da época, Chencho tinha apenas 9 jogos realizados e apenas 4 foram na condição de titular. Com apenas dois golos marcados e sem convencer o técnico, Chencho é emprestado ao NEROCA da segunda divisão indiana para voltar a ganhar algum ritmo, participa em cinco jogos, em todos eles a começar de início, e fez balancear as redes por 2 vezes. Terminou a época com quatro golos marcados, manifestamente pouco para aquilo que vinha a protagonizar. Mesmo assim, foi uma época de festa porque o Bengalaru tornou-se campeão da primeira divisão da Índia pela primeira vez na sua história e Chencho também contribuiu para esse título.

Em janeiro deste ano, com 23 anos, Chencho volta a casa para representar o Paro FC que disputaria também a qualificação para a Liga dos Campeões Asiática. E as coisas não estão a correr mal para já. A primeira equipa no caminho era os Defenders Football Club do Sri Lanka. Com dois empates (3-3 no Sri Lanka e 2-2 em casa, no Butão) valeu a regra dos golos fora para o Paro FC seguir em frente na prova. Se não fosse por Chencho, provavelmente teriam sido eliminados: no primeiro jogo, no Sri Lanka, Chencho fez o gosto ao pé e uma assistência e no jogo em casa, no Butão, Chenco voltaria a marcar sendo decisivo para a continuação em prova do Paro. A segunda eliminatória, quis o destino que fosse contra o seu último clube, o Bengalaru. No primeiro jogo realizado no Butão, o Paro perdeu por uma bola a zero levando contrariando o imenso favoritismo do Bengalaru. Mas o que aconteceu no jogo de ida, na Índia, a 12 de fevereiro de 2020 foi para esquecer: o Paro foi goleado por 9-1, com o único golo a ser marcado, claro está, por Chencho Gyeltshen.

Resolvemos deixar aqui este espaço para dedicar à seleção do Butão que com Chencho têm crescido nos últimos anos tendo, em 2016, atingido a posição 177 do ranking, um máximo para a seleção do Butão (atualmente encontram-se na posição 189). Chencho, que neste momento possui 35 internacionalizações com 9 golos marcados, estreou-se pela seleção do Butão a 3 de março de 2015 com apenas 15 anos num amigável diante do Nepal.

A sua estreia numa competição oficial foi num jogo diante do Sri Lanka nas pré-eliminatórias de apuramento para o Mundial 2018 que terminou com uma vitória por 1-0. O seu primeiro golo pela seleção foi no jogo seguinte, novamente diante do Sri Lanka (desta vez jogando em casa), o Butão ganhou por 2-1 com o golo da vitória a ser marcado já no tempo de compensação. Nessa partida, Chencho bisou e tornou-se o novo herói do futebol butanês. O Butão tinha-se qualificado pela primeira vez para a fase de grupos de apuramento de um Mundial, tendo calhado num grupo com a China, Maldivas, Hong Kong e Catar terminando a fase de grupos em último lugar com... zero pontos. Um grupo difícil, com países que têm mais condições e onde grande parte dos jogadores jogam como profissionais e apenas têm o futebol como sustento das suas vidas. Mesmo assim, a história foi feita.

Atualmente, para o apuramento para o novo Mundial, o adversário das pré-eliminatórias foi o Guam, que um território insular dos EUA na Micronésia. Se o primeiro jogo em casa correu da melhor forma possível com a vitória por uma bola a zero, Chencho e companhia não esperariam certamente que a segunda mão não fosse correr da melhor forma: o Butão foi goleado por 5-0 e disse adeus a uma possível chegada à fase de grupos de apuramento. Uma desilusão.

Não sabemos o que o futuro reservar a Chencho. Percebemos que é pode ser considerado atualmente o melhor jogador do Butão apesar da sua tenra idade (23 anos). O salto para um país com uma liga mais competitiva deverá estar no horizotne de Chencho e, quem sabe, um dia jogar no futebol europeu. Se conseguir estabilidade a nível de carreira, são raras as vezes que passou mais que uma temporada num clube, poderão ser fundamentais para Chencho atingir um outro patamar futebolístico. Apesar de tudo, não é qualquer jogador que pode ser considerado como o Ronaldo do Butão.

Llanfairpwllgwyngyll Football Club, o clube com o nome mais estranho (e longo!) do mundo

07.04.20, Terceiro Tempo

Alguma vez deu de caras com nomes extremamente estranhos no mundo do futebol? De certo que já viu muitos como Crystal Palace (de Inglaterra), Robin Hood (do Suriname), Venta de Baños (Espanha), e muitos outros... mas o clube que trazemos hoje, se não for o clube com o nome mais comprido (e estranho!) andará muito perto disso. Falamos do Llanfairpwllgwyngyll Football Club e calma, este é o nome abreviado do clube porque se for sem qualquer tipo de abreviatura, o nome do clube é... Clwb Pel Droed Llanfair­pwllgwyngyll­gogery­chwyrn­drobwll­llan­tysilio­gogo­goch Football Club. De loucos, não? Por isso, vamos referir ao clube apenas como Llanfairpwllgwyngyll pelo bem da nossa sanidade mental.

O Llanfairpwllgwyngyll foi fundado em 1899 estando na altura desta publicação a cumprir o seu 121 ano de muitas histórias e (poucas) conquistas. Fundado na pequena cidade com o mesmo nome, localizada na ilha de Anglesey, no noroeste do País de Gales. O clube foi fundado com o nome Llanfair Rovers, bem diferente do nome que possuí atualmente.

O porquê da mudança do nome? O motivo mistura-se com a história da cidade onde fica sediado o clube. O nome do pequena vila era Llanfair Pwllgwyngyll, mas em 1860, um morador teve a brilhante ideia de criar uma estação de comboios com o maior nome do Reino Unido, o que, segundo ele, atrairia mais turistas.

Assim surgiu a cidade de Llanfairpwllgwyngyllgogerychwyrndrobwllllantysiliogogogoch, que, em tradução livre do idioma galês para o português, significa “Igreja de Santa Maria no fundo da aveleira branca perto de um redemoinho rápido e da Igreja de São Tisílio da gruta vermelha”... fantástico, não é?

Apesar da grande (literalmente) expressão do nome, o clube tem pouca tradição no que diz respeito ao futebol propriamente dito sem existir qualquer registo do clube na primeira divisão no País de Gales. O clube é semiprofissional, muito dos seus jogadores possuem outros empregos não se focam a 100% no futebol e apenas se unem no Llanfairpwllgwyngyll Football Club para treinarem devido ao gosto que têm pelo futebol. O clube, que se orgulha nas redes sociais, de ser o clube com o nome mais longo do futebol mundial, possui no seu historial apenas duas conquistas de renome, a Welsh Alliance League, conquistada na temporada de 1987/88 e 2000/01, que corresponde à terceira divisão portuguesa. Tudo o resto são conquistas amadores (o clube afirma serem mais de 30). Keith Jones é o quarto treinador da equipa num período de 30, o que por si só é único nestes tempos constantes de mudanças. Sendo um clube sem muitas condições, a equipa é composta apenas por jogadores locais, na sua maioria jogadores que passaram pelas camadas jovens do clube. Atualmente, o jogador que se encontra há mais tempo no clube é Steve Smith que assinou pelo clube há 13 anos atrás.

Os nossos jogadores não recebem dinheiro para jogar no clube. Somos amadores. Ou seja, jogamos futebol, mas cada um tem seu emprego. Para dar-vos um exemplo, temos um eletricista, um professor de escola primária, ... Eu sou vendedor de produtos siderúrgicos. O Arwyn Owen, uma jovem promessa, que muitos dizem ser o Lionel Messi do País de Gales, trabalha numa empresa que cortar árvores. Além disso, temos alguns jogadores na faixa de 17 ou 18 anos que são estudantes universitários. Para a maioria, essa questão não é um problema, mas já tivemos casos de jogadores chegarem atrasados para as partidas, com a roupa de trabalho vestidas.

Steve Smith, defesa-central do clube.

O Llanfairpwllgwyngyll FC jogas as suas partidas no Maes Ellian, estádio que tem uma lotação de 1500 pessoas, sendo que desses 1500 lugares, 50 são lugares sentados.

Para aqueles que são um pouco mais curiosos, aqui fica um vídeo para entenderem como se pronuncia o nome da cidade: